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MP de Bolsonaro exclui sindicatos e suspende salário e emprego dos trabalhadores

Proposta do governo flexibiliza leis trabalhistas durante calamidade pública no Brasil



O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) editou na calada da noite de domingo (22) a Medida Provisória (MP) 927, de 2020, que autoriza a suspensão do contrato de trabalho por até quatro meses.

O governo já havia divulgado a proposta há alguns dias, mas somente agora oficializou. Para entrar em vigor, o Congresso precisa aprovar no prazo de até 120 dias para não perder a validade. A ideia é fazer com que a medida fique em vigor até o fim do ano, prazo definido para o estado de calamidade pública.

Como parte de um conjunto de ações do governo para combater os efeitos econômicos da pandemia do novo coronavírus, a medida traz inúmeros prejuízos aos trabalhadores e ao país.

De acordo com a MP, o empregador poderá conceder ao trabalhador “ajuda compensatória mensal”, "sem natureza salarial", "com valor definido livremente entre empregado e empregador, via negociação individual.".  Isso significa que o trabalhador ficará sem salário e sem o sindicato para fazer acordos ou convenções coletivas que possam garantir os direitos durante a pandemia.

“Esta MP é inaceitável. Como deixar o trabalhador quatro meses sem salário? E esse é apenas um dos pontos dessa medida nefasta que confere poderes às empresas, exclui os sindicatos de qualquer negociação, avança sobre a retirada de direitos e aprofunda a precarização das condições de trabalho, em especial, dos profissionais de saúde ao permitir o aumento da jornada de trabalho, colocando em risco esses trabalhadores que cuidam da nossa saúde”, afirma o presidente da CUT São Paulo, Douglas Izzo, em referência ao artigo 26 da MP.

Para o diretor técnico do Dieese, Fausto Augusto Junior, em entrevista à Rádio Brasil atual nesta segunda-feira (23), o governo deixa de promover “medidas efetivas para a sua proteção, e para os mais pobres, [priorizando] bancos e empresas”, disse o sociólogo.

Devolve MP

O governo assinou esta medida na calada da noite, desrespeitando direitos trabalhistas assegurados em lei, afirma o bancário e vice-presidente da CUT São Paulo, Luiz Claudio Marcolino.

“A MP não garante emprego dos trabalhadores e aponta que, caso o trabalhador seja demitido, o empregador deverá fazer recolhimento do FGTS. A medida deixa implícito que pode haver demissão neste período. Isso quer dizer que o trabalhador não tem nem garantia de emprego durante a pandemia e nem depois dela”, diz.

Marcolino reforça que, mesmo diante de tantas reformas governamentais que retiraram direitos, os trabalhadores precisam compreender que estão assegurados pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e que as entidades sindicais devem ajudar na construção de acordos ou convenções coletivas que favoreçam todas as categorias.

“A MP rasga tudo isso, constrói relações desiguais entre empregado e patrão. Isso é uma afronta às relações de trabalho. Bom lembrar que ninguém está ficando em casa porque quer. É uma pandemia. E Bolsonaro se aproveita do momento de crise para tentar implementar uma política que afeta a renda e os direitos que ele não conseguiria em uma condição normal do país. É necessário que o Congresso tenha sensibilidade e devolva a MP. Cobre o presidente medidas de proteção e não de restrição de salário, emprego e renda”, orienta.

Em nota, a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho criticou que o governo tenha pedido “sacrifícios” individuais aos trabalhadores, desconsiderando medidas coletivas para resolver a situação do país.

Segundo a entidade, a MP não sugere soluções “tais como a taxação sobre grandes fortunas, que tem previsão constitucional; a intervenção estatal para redução dos juros bancários, inclusive sobre cartão de crédito, que também tem resguardo constitucional; a isenção de impostos sobre folha de salário e sobre a circulação de bens e serviços, de forma extraordinária, para desonerar o empregador”, exemplifica a associação.

Economia em crise

A Medida Provisória causa insegurança tanto do ponto de vista jurídico, face às inconstitucionalidades explícitas, mas principalmente em relação as condições de sobrevivência dos trabalhadores, afirma o advogado especialista em direito do trabalho, Vinícius Cascone.

“Sem renda, não será possível comprar comida e nem garantir as necessidades básicas para as respectivas famílias. Ainda, considerando que os trabalhadores são os responsáveis pelo consumo, ao retirar o poder de compra, os próprios empregadores serão prejudicados com a diminuição do consumo.”.

Ao contrário de países como Itália, França, Reino Unido e Estados Unidos, que têm criado medidas protetivas do emprego e da renda, o Brasil opta pela retirada de direitos e pelo agravamento da crise, alerta o secretário-geral da CUT São Paulo, João Cayres.

Para ele, o país deveria criar medidas anticíclicas adotadas até mesmo por governos anteriores em momento de crise.

“Essa MP irá prejudicar a população como um todo, desde os mais pobres à classe média que não suporta um mês sem salário, imagine quatro. Além disso, se os trabalhadores ficarem sem renda, haverá um impacto na redução do consumo bastante trágico e, consequentemente, no PIB [Produto Interno Bruto] brasileiro”, avalia.

O dirigente exemplifica que até mesmo o governo de El Salvador, de Nayib Bukele, estabeleceu medidas de suspensão de contas de energia elétrica, de água, de telefonia e de internet por três meses, dividindo essas contas em dois anos, como forma de ajudar os trabalhadores.

“Ou seja, um país pobre e pequeno da América Central consegue fazer isso. O Brasil que, inclusive, está entre as 10 principais economias do mundo, não faz isso”, conclui.

Nesta segunda (23), entidades sindicais e movimentos sociais mobilizam as redes sociais com a hashtag #DevolveMP, exigindo que os presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado, Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre, respectivamente, barrem a medida assinada pelo presidente da República. Um "panelaço" nas janelas contra Bolsonaro também está sendo convocado para as 20h30. 

Escrito por: Vanessa Ramos - CUT São Paulo

23/03/2020